sábado, 13 de janeiro de 2007

Darfur e a nova ordem mundial

O que está por traz do conflito no Sudão
Por Sara Manera
A região de Darfur se localiza no oeste do Sudão e faz divisa com 10 países. Esta província esta sendo palco do primeiro conflito do século XXI e já é considerado um dos mais bárbaros.
A crise começou quando em 2003 dois grupos rebeldes atacaram postos governamentais acusando-o de descriminação e abandono da província de Darfur, onde a maioria da população é negra, cristã ou animista. Enquanto o norte do país, onde esta a capital Cartum, é de origem árabe e mulçumana.
Este foi o estopim para que desencadeasse a limpeza étnica da população da região. Forças do exército sudanês e a milícia pró-árabe, Janjaweed (homens de cavalos com armas) apoiada pelo governo, são acusados de bombardear e queimar vilas, matar civis indiscriminadamente, estuprar mulheres e expulsar milhares de pessoas de suas casas. Avalia-se que cerca de 300 mil pessoas morreram desde o início do conflito.
Cerca de dois milhões de pessoas, foram expulsas de suas casas e incham os campos de deslocados. Estes campos se situam no próprio Sudão e em países fronteiriços. O principal a acolher refugiados é o Chade, onde a tensão vem crescendo.

Instabilidade - A instabilidade na região é preocupante. Os campos de deslocados situados na divisa do Sudão com o Chade são constantemente atacados pela milícia janjaweed. O governo Chadiano cortou relações diplomáticas com seu vizinho em abril de 2006 e o acusa de tentar derrubar seu governo.
A preocupação do Chade que o conflito se espalhe por seu território é grande, pois na parte ocidental do país há uma composição étnica semelhante à de Darfur. Os dois governos trocam acusações e o Chadiano já ameaçou expulsar aproximadamente 200 mil refugiados, o que aumentaria ainda mais a crise.

Estupro como arma de guerra - Os estupros são uma prática recorrente, quase compulsória, nos ataques às vilas, às vezes são cometidos na frente da família e dos habitantes do lugar com o intuito de ofender, humilhar a população. Muitas mulheres são seqüestradas e usadas como escravas sexuais antes de morrer ou serem libertadas.
Quando as mulheres deixam os campos de deslocados para buscar lenha, as milícias Janjaweed estão à espreita. As tropas da União Africana (UA) patrulham os arredores, mesmo assim muitas são estupradas. Esta é a maior parte do trabalho dos 7 mil soldadosda UA, que têm um mandato limitado, falta de equipamentos e de pessoal para cobrir uma área do tamanho da França.

União Africana e ONU - A União Africana é um dos poucos entraves para que o governo sudanês e os Janjaweed não dizimem de vez a população de Darfur. A UA quer que a Organização das Nações Unidas (ONU) assuma a missão de paz na região, mas essa hipótese é rejeitada pelo governo sudanês.
O mandato da UA terminou em setembro, mas foi revogado depois que o governo sudanês permitiu que as tropas permanecessem no país. O governo sudanês pondera sobre a possibilidade de aceitar uma força de paz mista, com soldados da ONU e da União Africana.
Com a dimensão tomada pelo conflito e com a pressão da comunidade internacional o governo sudanês se comprometeu a desarmar os janjaweed. Apesar das provas irrefutáveis o governo afirma não armar a milícia que atua conjuntamente com o exército. No entanto este desarmamento não está acontecendo.
A ONU não reconhece em Darfur um genocídio. Segundo a organização o governo do Sudão "não implementou uma política de genocídio". Os responsáveis, porém, podem ser acusados de crimes de guerra e contra a humanidade, e processados pelo Tribunal Criminal Internacional de Haia, na Holanda.
A Organização das Nações Unidas chega ao final deste ano sem conseguir acabar com o conflito em Darfur, sem recursos e sem moral. Estamos vendo a ineficiência de um organismo que tem suas decisões sistematicamente descumpridas pelo EUA, Inglaterra, Israel e pelo Sudão, principais envolvidos nos conflitos mais importantes deste início de século.
A organização ameaçou impor sanções contra o setor petroleiro do Sudão se a violência não fosse reprimida. Em março de 2005 o Conselho de Segurança da ONU aprovou uma resolução para a imposição de sanções às pessoas que dificultarem o processo de paz na região ou violar os direitos humanos, mas até o momento não foram aplicadas. A China e a Rússia se opuseram a esta resolução.
Genocídio é um empreendimento caro e o governo depende dos investimentos externos para financiar suas ações na região de Darfur. Ironicamente a China, vem investindo milhões de dólares no Sudão, país rico em petróleo. Especialistas acusam o país de tentar estabelecer um novo imperialismo no continente e não exigir de seus parceiros comerciais comprometimento com os direitos humanos e o meio ambiente.

O dragão vermelho na África - A China é uma das poucas, senão a única, potência capaz de estremecer a hegemonia americana no século XXI. O país que tem um dos maiores índices de crescimento (aproximadamente 9% ao ano) do mundo precisa de grandes reservas de petróleo para continuar crescendo. Hoje, seu maior fornecedor de petróleo è Angola, que desbancou a Arábia Saudita e se transformou em um posto avançado do país no continente africano.
No início de novembro do ano passado a China recebeu em Pequim 48 líderes de estados africanos no Fórum de Cooperação África-China. Esta foi a maior conferência já realizada pela potência emergente com países africanos para o debate sobre comércio e desenvolvimento.
A China anunciou durante a conferência um pacote de ajuda humanitária e investimentos visando a ampliação do comércio. Segundo o governo chinês os investimentos devem chegar este ano a US$ 50 bilhões (RS$ 107 bilhões). Segundo o Banco Mundial os investimentos triplicaram de 2003 para 2004 e cerca de 700 empresas chinesas estão no continente.
O país busca mercados para seus produtos industriais. A África é um mercado consumidor a ser explorado e um bom fornecedor de matérias–primas, principalmente minérios e petróleo. O continente lucra, pois tem acesso a crédito facilitado e a investimentos além de aumentar suas exportações.
A China ganha aliados no cenário internacional e os países africanos ganham um “padrinho” de peso, que não se intromete em assuntos internos e tem direto a veto no Conselho de Segurança da ONU.
Sentimos hoje o poder da China e podemos avaliar a sua importância no mundo em um futuro bastante próximo. O conflito no Sudão é mais um dos palcos onde a guerra comercial, por poder e influência política acontece.
Com a instabilidade vivida no Oriente Médio, principal fornecedor mundial de petróleo, fornecedores secundários passam a ter importância vital para as potências. Os EUA e a Inglaterra, que vem criticando o governo sudanês e pressionando a ONU para implantar sanções, na verdade lutam por influência em um continente cheio de conflitos regionais, minérios e petróleo.